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Chester: “Nós somos o Linkin Park. Tudo o que fazemos é Linkin Park”

O Linkin Park é capa da última edição da Upset Magazine, contendo uma entrevista com Mike ShinodaChester Bennington a respeito do novo álbum One More Light, que estreia no dia 19 de maio. Confira abaixo a tradução da entrevista. Clique aqui para conferir as scans.

“Lá vamos nós de novo”, diz Mike com um sorriso.

“Vamos ver o que dirão dessa aqui”. O Linkin Park tem um longo histórico de mudanças. De se arriscar. De misturar as coisas. Antes chamados de Hybrid Theory, essa é uma ideia que ficou (teoria híbrida). O legado de seis álbuns está cheio de saltos musicais, misturas revolucionárias e uma vontade muito forte de fazer o que querem.

Nenhum álbum é igual ao outro, e todo passo sempre vai longe. “Nos últimos quatro, talvez até cinco álbuns, tivemos essa conversa, mas não tenho medo de me arriscar e falhar”. Basicamente, a ideia de forçar um pouco as coisas é “para outras pessoas decidirem. No último álbum, lançamos uma música de metal com Rakim na ponte – toma essa, pessoal. Em certo ponto, você sente como se estivesse se contrariando ou se estivesse louco apenas pelo fato de irritar as pessoas, mas foi diferente com essa gravação. Não sentimos que queríamos apenas irritar as pessoas. Sério.” O sétimo álbum vê a banda como ela sempre foi: exatamente como os agrada. Que se danem as consequências.

“Eu quero que as pessoas pensem que criativamente falando, como artistas, esses caras tem coragem,” sorri Chester Bennington. “Eles vão aonde querem. Não ligam pra regras do que supostamente devem ser nos olhos de pessoas de fora. Nós somos o Linkin Park, portanto a música que fazemos é Linkin Park. Pra mim, isso é bem arriscado. Eu queria que as pessoas não só gostassem de ouvir o álbum, mas que também apreciassem o perigo, de certa forma, do que estamos fazendo e como estamos dispostos a seguir em frente sem medo.”

Não tem como sair dessa. O novo álbum One More Light está drasticamente diferente de tudo que a banda já fez. Do início ao fim, é pop. É o oposto polar do The Hunting Party (2014), e – enquanto Chester diz que “estando no Linkin Park, já ouvi milhares de demos nas quais trabalhamos, então não é uma surpresa ou estranho pra mim” – todas as partes parecem como algo completamente novo. E isso é muito animador, já que poucas bandas conseguem fazer algo parecido após lançar o primeiro álbum.

Animo é o coração do Linkin Park. Eles estão empolgados pra falar sobre música, estar em volta da música, fazer música. Você percebe a emoção na voz de Chester enquanto ele lembra do que Brian May disse em uma entrevista, que não são muitos grupos que se arriscam como o Linkin Park faz. “Foi muito legal ser visto dessa forma por alguém que eu admiro, que também esteve em uma banda que se arriscava e não tinha medo de fazer o que quisessem ou ser quem eram de verdade. Eu sinto que prosperei nesse álbum só por causa daquele comentário”. E você sabe como o Mike tenta se conter de ficar tagarelando sobre as músicas novas que ele descobriu. Quando você coloca os dois juntos numa sala, é uma hiperatividade sem fim.

Você pode sentir o prazer através de One More Light. Desde a abertura falhada de Nobody Can Save Me, a banda aprecia seu novo espaço. “É como renascer. Nos sentimos assim poucas vezes na nossa carreira”, começa Mike. “A referência mais óbvia é o terceiro álbum Minutes to Midnight. Os dois primeiros eram bem parecidos um com o outro, e aí o terceiro foi arriscado, bem diferente do que as pessoas esperavam. Naquele ponto nos perguntávamos ‘temos que fazer o que nos torna conhecidos ou o que as pessoas esperam?’ e lançamos esse álbum que foi um retalho de sons, com cada música diferente da outra. Nós deixamos a sequência dessa forma intencionalmente, para exagerar mesmo a diferença entre as músicas. Esse álbum é bem menos um retalho; é mais uma mistura de estilos que é o centro de tudo. Inventar um novo estilo e sons e fazer isso consistentemente pelo álbum leva tempo. Provavelmente levamos de 12 a 18 meses nisso. Sabe quando ouve alguns álbuns, e se trata de algo ou do momento? Esse não é assim. É sobre várias coisas diferentes, e parte disso porque todos nós passamos por coisas diferentes.”

“Eu gosto de pensar que nossa música teve participação na mistura de gêneros,” Mike explica enquanto a banda ainda estava na estrada para o último álbum. “É assim que nossa música funciona desde o início. Nunca sentimos como se carregássemos uma bandeira de nu metal, mas definitivamente carregamos uma para pessoas que amam vários tipos de música.” Agora, junto com o rock, hip hop e outras coisas, o Linkin Park também pode adicionar o pop à lista. E eles estavam pensando sobre qual tipo de pop queriam fazer.

“Se você está em um nicho, tipo hip hop ou metal, você pode dizer que gosta de doom ou black metal. É bem específico, e o mesmo ocorre no hip hop. Tem uma grande diferença entre Future e Action Bonson mas quem não ouve hip hop não vê a diferença. Acredite ou não, eu ouço muito pop. Tem estilos de pop que eu gosto, e outros que não gosto. Não fizemos pop do tipo ‘Oh girl, baby, I love you, e nem I want to see you dance, I want to see you shake’. Há certos tópicos e estilos que escolhemos ou não fazer, independente do gênero.”

Isso é o que faz o álbum ser único. Em nenhum momento One More Light parece algo feito nas coxas. Ou como se fosse obrigado. Ou seguindo a moda. Há muitas bandas de rock pegando influência do pop, mas o álbum não é assim. Mais do que um eco, ele é a banda comemorando as nuances de um gênero e se envolvendo em conversas.

Em One More Light o Linkin Park faz o que sempre fez: pega as coisas que gostam e misturam tudo. Se juntando a Stormzy em Good Goodbye, não é a banda tentando agarrar o sucesso do Grime. “Não somos tão espertos assim”, diz Chester. Mike virou fã há poucos anos e queria ver o que poderia acontecer. “Eu sinto que quando alguns artistas exploram território fora da zona de conforto, é como se fossem turistas, ou um hobby, ou um capricho. Para mim, a diferença é quando eu quero colocar algo em uma música. Eu quero sentir como se não estivesse violando algo. Eu quero que pareça que eu sei o que estou fazendo e que venha de um lugar de empolgação real como fã e como apreciador de música.”

“A primeira coisa que aconteceu foi curiosidade,” diz Mike. “Todas as vezes que estamos no estúdio, eu quero sentir que estou fazendo algo de diferente. Que estou aprendendo algo. Não quero que seja chato.” Normalmente um álbum do Linkin Park sai de centenas de demos instrumentais, com a banda marcando as que mais gostam. As com mais votos são exploradas, trabalhadas e terminadas. As letras vêm depois, influenciadas a partir de como o som se parece e o que a memória traz. Há sempre muita volta no passado. “Você cria personagens ao redor da situação e relaciona suas experiências com as deles. Esses personagens se relacionam com Brad [Delson, guitarra], Mike, e todos na banda. One More Light foi diferente, mas provavelmente você poderia ter adivinhado que ao invés da última peça do quebra-cabeças, as letras vieram primeiro e vieram através de conversas. ‘Oi gente, eu tô passando por isso, isso e isso e é sobre isso que vamos escrever.’ Quando um de nossos amigos que trabalhou conosco na gravação por vários anos faleceu, escrevemos uma música a respeito. Não iríamos escrever uma música sobre perda e aí relacionar nossas experiencias pessoas a ela de modo que pudéssemos compreender. Vem do que está acontecendo. O sentimento que temos escrevendo está lá. É poderoso.”

One More Light é o álbum mais empoderado e lindo que o Linkin Park já fez. Não é pesado como Crawling ou Guilty All The Same, e não há músicas de metal para satisfazer a galera do contra. “Temos outros seis álbuns”, lembra Mike. Pelo contrário, esse álbum é pesado como o peso do mundo. “Eu sinto muitas coisas, como se você estivesse enfrentando algo interior ou de fora, são muito pesadas emocionalmente,” explica Mike. “Quando olho no Twitter ou quando assisto notícias ou ouço meus amigos conversando, nem precisa ser sobre politica, mas quando os ouço falar sobre a vida, a coisa fica pesada.”

Mas o álbum parece como se estivesse em casa. A faixa título do álbum é sobre a morte de um amigo e explora “a ideia de que a vida é curta. Há tantos de nós e o que parece importante para alguns é só mais um dia normal para outros. Nesse lugar triste e solitário, às vezes pode parecer horrível, e você se pergunta ‘qual o sentido?’ E a música pergunta ‘qual o sentido de tudo isso? Quem se importa’? E a resposta é ‘eu me importo’. Mesmo que parece não haver sentido, tem sim. E o sentido é que eu me importo. Eu me importo o suficiente para prestar atenção; eu me importo o suficiente para seguir em frente.”

Não apenas promessas vazias, essa questão de seguir em frente é algo com o que Chester lutou entre as gravações. “Para mim, os dois últimos anos foram bem difíceis. 2015 foi o pior ano da minha vida. 2016 foi um pouco melhor, mas também muito difícil. Houveram momentos nesses últimos anos que eu sentia que ia desistir de tudo. Queria me distanciar da vida e de todos que conheço.”

“É difícil colocar em palavras o que me impediu de fazer essas coisas,” ele continua. “É como falar sobre ansiedade. A menos que você tenha, é difícil de entender. Eu acho que é por isso que colocam viciados com outros viciados e alcoólatras com outros alcoólatras, porque eles entendem. Pessoas que não são assim não vão entender. Eles podem criar empatia, mas nunca serão capazes de entender. Não é só sobre isso também; é sobre depressão, raiva e sentir que você nunca vai pertencer a algum lugar. Eu já tive crises muito fortes de depressão. Lutei contra isso por toda minha vida, e chegou a um ponto em que eu estava tão deprimido e ficava emputecido com várias coisas, e aí tive um estalo. É diferente de se sentir super puto o tempo todo, foda-se todo mundo. A partir daí comecei a trabalhar nesses problemas.”

“Cheguei a um ponto em que eu poderia chutar o balde, o que é assustador, ou dar uma reviravolta na vida. Depois que meu padrasto faleceu, depois que algumas pessoas próximas faleceram, e outra pessoa muita próxima tentou se matar, depois de tudo ruir eu pensei ‘eu não gosto da forma que me sinto em relação ao que está acontecendo’. Mesmo podendo me relacionar a um suicida, já me senti assim antes, mas não quero que meus filhos tenham que lidar com isso. Não quero que as pessoas que fazem parte da minha vida precisem lidar com isso. Mesmo que o suicídio pareça a solução às vezes, não é. Então eu tenho uma escolha. Posso desistir, ou dar um jeito de ter a vida que quero ter. Você pode jogar a toalha ou pegar sua vida de volta. Uma das coisas que amo em Battle Symphony é a letra. Sou eu admitindo não ser prefeito, que a vida é uma bagunça, mas quer saber? Eu tenho o que preciso dentro de mim para juntar os pedaços, sacudir a poeira e seguir em frente.”

“As letras nessas músicas são complexas e cheias de conflito”, explica Mike. “É a vida acontecendo. Sharp Edges é sobre o que te dizem quando você está crescendo, basicamente, não coloque as mãos no fogão quente. Mas a música termina te lembrando que às vezes você precisa pôr a mão no fogão quente. Às vezes você não tem escolha. Nem sempre você vai se queimar, e se alguém disser ‘não toque nisso, está quente, você vai se machucar’, você ainda não faz ideia do que significa até tocar no fogão. O que eu acabei descobrindo é que não quero apenas ser feliz. Eu preciso descobrir como viver seguindo as regras da vida. Ela vai seguir o caminho que tem que seguir e eu preciso ficar bem com isso. Eu quero ficar bem, não importa o que aconteça. É meu novo mantra. Se é uma coisa boa, ótimo. Se não é, ótimo também.”

Tem sido uma jornada difícil desde a ideia da música I Hate The World Right Now que ainda está no celular de Chester e foi escrita bem no começo do processo, e quase foi aceita para estar no álbum One More Light. Há uma solução, mas o conflito, a confusão e as lutas estão sempre presentes.

“Se você apenas lesse as letras do álbum sem música, seria bem deprimente”, diz Chester. “Mas a música, eu acredito que ela seja a esperança. Transforma as letras de algo sombrio pra algo mais. Estamos cantando sobre coisas difíceis, mas é bem positivo. É bem animador de certa forma, e eu queria que isso fosse transmitido no título do álbum. ‘One More Light’ caiu muito bem. É a esperança, especialmente com a arte. Você vê a inocência das crianças brincando na praia enquanto o sol está se pondo e elas estão curtindo o máximo que podem, enquanto podem. Não há nada mais esperançoso no mundo do que o mundo visto através dos olhos de uma criança. Pra mim é isso que significa. É essa esperança. O álbum gira em torno disso. É pelo que todos batalhamos, a bondade.”

“Uma coisa em comum em todo álbum é a falta de controle”, explica Mike, que está sentado pensando no que une todo o álbum. “Muita miséria humana, de muita da nossa luta humana, gira em torno do controle e da falta dele. Se você parar pra pensar, tudo que você não consegue controlar te dá uma emoção negativa. Estar disponível a chegar em um lugar onde você não precisa mais ter controle sobre tudo ou admite que você não tem, é muito importante. Você quer ficar bem com toda a merda que acontece, mas se estivéssemos todos zen sobre tudo, o álbum seria uma merda.”

“Ninguém quer assistir programas de TV sobre coisas legais acontecendo com pessoas legais. Seria a pior coisa do mundo”, adiciona Chester. “Você não se sente um bosta por eles, não é interessante. O que é legal são as coisas podres que acontecem. É intrigante. Conflito e solução. Não pode ser só solução.”

Com um álbum como One More Light, o Linkin Park está fadado a inspirar certo conflito e tensão. “Não posso controlar o que as pessoas vão dizer, então não estou preocupado com a reação delas. Eu sei que terão pessoas que estarão super animadas com o álbum, e pessoas que ficarão bem bravas por não ser o que quer que eles tenham em mente, e terão pessoas que não conhecem a banda muito bem, e esse será um novo som que vão experimentar”, diz Mike com um sorriso. “Tudo isso está em jogo pra nós, e é muito engraçado, porque nós somos pais também; também tivemos momentos onde olhávamos para as coisas mais importantes de outro ponto de vista pela primeira vez. Houve um momento em um de nossos shows que olhei e vi um pai e sua filha. Ele estava animado com algumas músicas; dançava com ela como se estivesse dizendo ‘essa é minha música’ e ela fazia a mesma coisa com ele em relação as músicas novas. Talvez inconscientemente aquilo ficou preso na minha cabeça porque penso no que meus filhos gostam, e eu sei que toquei músicas para eles desse álbum e perguntei o que eles acharam. É legal. Eu aposto que se você perguntar pro meu filho qual música do papai eles querem ouvir, a que eles sempre pedem é ‘Castle Of Glass’ e do material novo, ‘Heavy’ é a favorita deles.

“Meus filhos sempre pedem ‘toque a música do papai!’ pra eles ouvirem o papai no rádio e tal. Mas eles sempre dizem que a música do papai é meio assustadora e em partícula,r ver o papai tocar é assustador, porque eu fico correndo, gritando e é bem intenso – mas o material novo não é assustador. As crianças mais velhas dizem ‘é, meu pai é do Linkin Park, tanto faz’. Mas meus filhos mais novos amam ‘Battle Symphony’, ‘Heavy’ e ‘Invisible’ principalmente. Eles cantam as músicas, e eles entendem o que está sendo dito, e gostam da música e ficam felizes. Eu acho que isso automaticamente os fazem gostar mais ainda da música. Pela primeira vez minhas filhas dizem ‘papai, cante aquela música!’ ao invés de ‘papai, shiu!’. Elas também dizem às pessoas que eu sou uma superestrela, o que é algo interessante porque todos os meus outros filhos ficam tipo ‘não quero falar sobre isso’. É engraçado.”

Tudo que está acontecendo com o Linkin Park, as coisas boas ou ruins, aparecem em One More Light. “O que falamos nesse álbum e o que fazemos liricamente, é um retrato das nossas vidas no presente momento ou num passado recente. Demoramos 13 meses pra fazer o álbum, não levamos muito tempo pra escrever a maioria das músicas, apenas demoramos mais porque queríamos ter a certeza de que tudo estava bem certo, em termos de construção de faixa e fazer tudo soar como está. Sentimentos que esse álbum era muito importante e outras pessoas também nos dizendo que esse álbum era importante, nos fez querer ter a certeza de que cada detalhe foi muito bem planejado. Eu sinto que esse álbum mostra quem somos no presente momento.” Das letras à certeza, o Linkin Park deixa uma coisa bem clara. “Não nos definimos pelo que fizemos. Nos definimos pelo que estamos fazendo.” Aqui vamos nós.

One More Light do Linkin Park estreia no dia 19 de maio.